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Coluna – Pimenta nos olhos dos outros é refresco


Memória curta é um problema recorrente no futebol brasileiro. E mais uma vez vemos isso no movimento atual dos principais clubes do futebol brasileiro, que reunidos na sede da CBF desejam que apenas três dos participantes da Série A sejam rebaixados para a B no fim da temporada. Parecem esquecer que, se assim fosse no passado recente, talvez não estivessem na elite agora. É o caso de América-MG (2015), o Bahia (2016), o Goiás (2018), o Cuiabá (2020) e o Vasco (2022) que subiram de série em quarto lugar..

É bom deixar claro que eu não discordo da iniciativa. Realmente, cai muita gente num campeonato de 20 times, tanto é que na Europa são três os rebaixados. E a tentativa de se criar uma liga para organizar o campeonato faz fortalecer essa tese, embora, no momento, os clubes ainda estejam divididos nessa iniciativa. Mas o que acho curioso é que a ideia seja lançada logo agora, quando os 12 – que lá em 1987 organizaram o Clube dos 13 – estão reunidos na primeira divisão.

A mudança no regulamento não seria das maiores, dentre as tantas que já vimos no Brasileirão, que começou em 1971 – a CBF, depois, reconheceu títulos conquistados de 1959 a 1970. O campeonato de 71 tinha 20 equipes e não previa rebaixamento, e surgiu para ser o primeiro campeonato verdadeiramente nacional. Naquela época a organização do futebol sofria forte influência governamental e, ano após ano, o total de participantes só fez crescer, até chegar a 94, em 1979.

Em 1980, a CBF organizou a competição pela primeira vez, criou três séries – Ouro, Prata e Bronze -, reduziu os participantes da oficiosa primeira divisão a 44, mas permitiu o acesso da Prata no meio do torneio – eram quatro vagas. Nesse período, por exemplo, o Palmeiras subiu para a Ouro em 81 e o Corinthians, em 82. Em 1984, a classificação para o Brasileiro se dava pelos resultados nos estaduais, mas como Vasco, no Rio, e o Grêmio, em Porto Alegre, não ganharam a vaga no campo, receberam convites para disputar a primeira divisão.

Outra grande mudança ocorreu em 1986, quando a CBF juntou todo mundo num campeonato com 80 integrantes. Pelo regulamento, após a primeira fase, os 28 melhores estariam na Série A em 1987. O Vasco ficou de fora, recorreu à justiça, seguiu no campeonato. No fim dele, Botafogo e Coritiba cairiam. E os recursos foram tantos, que a entidade abriu mão de organizar o torneio no ano seguinte, dando origem ao Clube dos 13, citado anteriormente. Ali, 36 anos atrás, eram dados os primeiros passos para a Liga, que não vingou.

Tanto que, em 1988, com 24 equipes, voltou o Brasileirão da CBF, rebaixando quatro times. De 1990 a 1992, caíam dois, mas subiram 12 times em 1993, e, com isso, caíram 8 naquele ano. Em 1994 e 1995, voltaram a serem dois os rebaixados. Em 1996, ninguém caiu, em razão das denúncias de corrupção na arbitragem. Em 1997 e 1998, voltaram a ser quatro. Em 1999, de novo ações na justiça impediram qualquer rebaixamento e, aí, veio o ápice da confusão: o Brasileiro de 2000, organizado pelo Clube dos 13, contou com 116 times!!! Entre eles o Fluminense, que disputou a Série C em 99 e, ao lado de outros 26 times da Terceirona subiu para a primeira divisão.

Em 2001, agora com 28 equipes e de novo nas mãos da CBF, o campeonato voltou a ter quatro rebaixados, que teria sido mantido até hoje, não fosse uma rápida mudança em 2003, quando caíram apenas dois times.

Como se vê, mudar os critérios de classificação e de rebaixamento é prática comum no Brasileirão. Se vingar a tentativa atual, será apenas mais uma, não se sabe se a última. Mas, só pra encerrar, caso ela prevalecesse já em 2006, quando a Série A passou a ter 20 equipes, alguns dos grandes teriam evitado suas quedas, por terem terminado o campeonato em 17º lugar, casos de Athletico-PR (2011), Internacional (2016), Cruzeiro (2019), Vasco (2020) e Grêmio (2021). E, curiosamente, a polêmica envolvendo a Portuguesa de Desportos, de 2013, também não existiria.

* Sergio du Bocage é apresentador do programa No Mundo da Bola, da TV Brasil



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