O destino das férias de julho deste ano foi mais longe do que o esperado para o professor da rede estadual de ensino Sadi Nunes da Rosa: pelo menos 8.739 quilômetros de distância do Colégio Estadual Cívico-Militar Novo Horizonte, em Toledo (Oeste do Estado), onde é diretor. Ao lado de outros 15 profissionais da educação voluntários de todo o Brasil, Sadi foi escolhido para integrar uma caravana pedagógica no campo de refugiados Dzaleka, no Malawi, país da África Oriental.

A ação é promovida pela ONG Fraternidade Sem Fronteiras (FSF), cujo foco é o trabalho humanitário. O professor da rede estadual embarcou no começo do mês passado e retornou ao Brasil nesta quarta-feira (2).

Na missão, além da experiência, poucas roupas, alguns materiais escolares e vários bilhetes escritos à mão por alunos da rede estadual, resultado prático de um dos trabalhos realizados em sala no primeiro semestre. “Um dos temas abordados foi a situação vulnerável na qual vivem tantos refugiados ao redor do mundo e a dificuldade que tantos jovens em idades semelhantes às dos nossos alunos sofrem para alcançar a educação básica”, revela Sadi.

A ida do professor à missão contou com a participação dos alunos das turmas do sexto, sétimo e oitavo anos do período da manhã do colégio Novo Horizonte. A faixa etária dos estudantes da rede estadual é a mesma dos 436 matriculados na escola do campo de refugiados do Malawi, que oferta ensino infantil e primário.

Além das cartas, os alunos também contribuíram com doações de itens como cadernos, lápis, canetas, borrachas e giz de cera. “Foi uma ação importante de aprendizado e de solidariedade, em que nossos alunos puderam entender o significado do gesto humanitário, doando, em alguns casos, um único lápis ou uma única borracha, mas cuja simbologia significa muito para a criança ou adolescente de um lugar tão vulnerável, como é o campo de refugiados”, diz o professor.

BOA RECEPTIVIDADE – Em solo africano, Sadi e a equipe de voluntários foram recepcionados na Ubuntu Nation School, no campo de Dzaleka, por meninos e meninas com idades entre 8 e 9 anos, nascidos em países como Congo, Ruanda, Burundi, Somália e Etiópia. Em uma das oficinas promovidas pelo grupo de brasileiros, os alunos retribuíram o carinho dos estudantes paranaenses escrevendo ou desenhando  mensagens. 

Segundo Sadi, a interação entre os alunos do Paraná e do Malawi vêm ao encontro da cultura Ubuntu. “Solidariedade e harmonia fazem parte da filosofia presente na cultura destes alunos. O senso de coletividade como pilar social se resume num lema que, traduzido para o português diz: ‘eu sou, porque nós somos'”, destaca. Para o professor, o contato com a comunidade escolar dos refugiados representou mais que mera experiência sociocultural. “Foi transformador”.

Durante os 15 dias nos quais esteve em Dzaleka, o professor Sadi promoveu debates e trocou experiências com os gestores da escola africana, apresentando o modelo de gestão adotado na rede estadual de ensino do Paraná. Um dos objetivos foi orientar a implantação de turmas do ensino médio no local, já que os estudantes contam somente com o ensino fundamental.

“Apresentei as metodologias de ensino e de gestão adotadas pela Secretaria da Educação do Paraná e os bons resultados obtidos a partir destes modelos. Expliquei brevemente as diretrizes do índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) na educação brasileira e os bom desempenho alcançado pelo Paraná neste ranking”, acrescentou. 

Além do campo de Dzaleka, Sadi visitou outras escolas na região. “Foi uma experiência rica em todos os sentidos. Eu também vou levar este aprendizado para o Colégio Estadual Cívico-Militar Novo Horizonte, visando promover lições sobre a pluralidade cultural e a valorização das diferenças”, afirma.

UM LUGAR DE RECOMEÇOS – Estabelecido em 1994 pela Organização das Nações Unidas (ONU), o campo de refugiados de Dzaleka, no Malawi, acolheu 9 mil sobreviventes do genocídio de Ruanda. Motivado por conflitos internos, extremistas étnicos vitimaram, naquele mesmo ano, cerca de 800 mil pessoas da etnia tutsi, além de adversários políticos. 

Atualmente, Dzaleka abriga 60 mil pessoas de diversas etnias em situação de desamparo e sem acesso a saúde, educação ou  trabalho. Em tradução livre, Dzaleka significa “fim da linha”. A escolha do nome deu-se pelo fato do local ter sediado, por anos, um presídio de segurança máxima. Mesmo assim, para os imigrantes, o campo representa um local de recomeços.



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