Meninos que se apaixonam por garotas mais velhas são uma ocorrência quase científica daquele período tormentoso, tenso, amargo, mas também doce e pleno de descobertas chamado adolescência. McG já havia se esmerado em desmistificar um pouco alguns dos lances mais incômodos ao longo da penosa transição da infância para a vida adulta e continua firme nesse propósito em “A Babá: Rainha da Morte”, desdobramento de um enredo nonsense e realista, caudaloso e preciso. McG dá um caráter mais, digamos, caseiro à narrativa de um amor nada convencional mencionando que essa garota é ninguém menos que a babá, de vinte e poucos anos, e irriga ainda mais o campo de sua insânia ao fazer dela uma assassina diabólica, versão loura, sexy e angelical de Satanás. Uma vez que só se ama mesmo quando se consegue ver como grandes qualidades os pequenos defeitos de quem se ama, esse rapaz, cada vez mais perdido, tarda a dar-se conta do quão absurdo é o sentimento que o enfeitiça. Trafegando nesse vácuo, o segundo longa devota-se a manter o interesse do público, enquanto também desenvolve uma cornucópia de novas subtramas, em que conflitos ainda mais intrincados tomam corpo e personagens igualmente cheios de dicotomias se avultam.

Cole, o arquétipo do adolescente tomado de idas e vindas e altos e baixos vivido por Judah Lewis, tentara convencer os pais, Archie e Phyliss, interpretados por Ken Marino e Leslie Bibb, de que Bee, a louraça belzebu em questão tem mesmo parte com o diabo, mas, por óbvio, passa por louco e fica a um triz de ir parar num manicômio. Bee, a antimusa personificada por Samara Weaving — a lufada de ar fresco numa coleção de fáceis repetições — no longa inaugural, cede espaço (à primeira vista apenas sob a perspectiva estética) a Melanie, a vizinha espevitada, mais afinada com o espírito maldito de Cole e também por essa razão completamente inclinada a acreditar nele. Emily Alyn Lind revela-se uma substituta à altura do talento de Weaving, potência artística mostrada com destaque em sequências como a da festa no lago, repleta dos cenários de sol e água cintilante tornados ainda mais vistosos na fotografia de Scott Henriksen. O texto de McG e seu trio de roteiristas equilibra bem — ao menos durante a transição do segundo para o terceiro ato — o sombrio e o radiante da vida, uma figura de linguagem bastante perspicaz da juventude, até que a aura predominantemente tétrica do filme se impõe, prestando-se como uma espécie de rito de passagem para o mocinho de Lewis e, o principal, inserindo na história a figura de Phoebe, contraponto soturno, macabro até, a Melanie.

Decerto o ponto mais alto do filme, Jenna Ortega, a aluna novata, é em “A Babá: Rainha da Morte” o que Bee fora em 2017. Torcendo o lugar-comum — o que a essa altura também já é um lugar-comum —, a aparência vampiresca de Phoebe oferece um contraste estimulante com seu altruísmo e, naturalmente, a garota compõe com Cole um casalzinho antirromântico comovente, até porque enfrentam crises de identidade e de credibilidade pública de graus similares. Ortega preparou com diligência o terreno para a personagem-título de “Wandinha” (2022) num filme num terror teen refinado, em que McG sugere, como quem não quer nada, um inusitado paralelo com o “Fausto” de Goethe.


Filme: A Babá: Rainha da Morte
Direção: McG
Ano: 2020
Gêneros: Terror/Comédia
Nota: 8/10



Via R7.com