O cenário da rotina e da correria na metrópole de 2,9 milhões de habitantes encanta os olhos acostumados e também os desavisados. Encanta também os poetas, como Caetano Veloso, que disse que tinha um amor grande que passaria “além do céu de Brasília”, do “traço dos arquitetos” (Lúcio Costa e Oscar Niemeyer).
“Gosto tanto dela assim”, afirmou Caetano. O que tem no chão desperta curiosidade pelos seus diferentes caminhos.
Nesse lugar, misturam-se esperanças e desigualdades de todos os dias desde que os traços se transformaram em prédios, ruas e avenidas animadas por sons do vai-e-vem da terceira cidade mais populosa do Brasil, conforme o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
A cidade, inaugurada há 65 anos e que só cresce, foi criada para expressar modernidade, integração e liberdade, segundo o arquiteto e urbanista Alberto de Faria, que é professor do Centro Universitário de Brasília (Ceub).
“A obra de Niemeyer estabelece referências visuais desse novo país, moderno e com oportunidades para todos”, afirma o professor.
Encontros
Uma dessas curiosidades é que, de fato, Brasília foi projetada sem esquinas. “Os encontros acontecem nas áreas verdes entre os comércios e as superquadras (residenciais), sem cruzamento com fluxos de veículos”, lembra Alberto de Faria. Ele explica que a ideia foi promover uma nova dinâmica urbana.
Por falar nessa imagem urbana, um mito é que Brasília foi desenhada pelo arquiteto Lúcio Costa em formato de avião. Segundo o especialista, essa interpretação é lúdica e não técnica, e teria sido difundida pela designação do nome Plano Piloto.
Lúcio Costa desenhou o plano piloto de Brasília com base em uma cruz: um eixo monumental (no sentido leste-oeste) cruzando com um eixo residencial (curvo, no sentido norte-sul). Ele descreveu sua proposta como uma “síntese entre a tradição e a modernidade”, e queria uma forma simples e funcional.
Parque gigante
Um fato que orgulha o brasiliense é que o Parque da Cidade se tornou o maior do gênero em espaço urbano do país. De acordo com o professor Alberto de Faria, o parque tem 420 hectares, o que equivale a 4,2 quilômetros quadrados.
“O Parque da Cidade Sarah Kubitschek, em Brasília, é maior do que o Central Park de Nova Iorque. É um espaço de convivência amplo e democrático, muito utilizado pela população de todas as idades”, explica.
Participação de operários
Nesse ir e vir, na concepção do arquiteto Oscar Niemeyer, prédios da cidade teriam liberdade de circulação para diminuir cercas e barreiras. Outro elemento dessa visão diferenciada são os icônicos painéis de azulejos de Athos Bulcão. “Os painéis foram montados com liberdade pelos operários”.
Inclusive, a primeira igreja católica de Brasília, a Igrejinha de Nossa Senhora de Fátima, é um exemplo da colaboração entre arquitetura e arte. “O projeto de Niemeyer, com os painéis de Athos Bulcão, cria espaços acolhedores para reflexão espiritual, trazendo referências de liberdade e desenvolvimento espiritual”, destaca o professor.